O que acontece no nosso organismo – quimicamente falando – quando nos ferimos?

É claro que seria extremamente complexo falar sobre todas as reações que se desencadeiam no nosso corpo quando cortamos o dedo ou quando batemos o dedinho no pé da mesa, pois há desde a dor até aquela sensação de impotência contra o mundo e a revolta que sentimos contra nós mesmos por termos sido capazes de tamanha estupidez. Portanto, vou focar somente na reação de defesa.

Nosso corpo é formado por células, como se elas fossem os “tijolinhos” que nos constroem. E as células são formadas por diversas organelas, o fluido intracelular, e pra “embrulhar” tudo isso, existe a membrana celular. A membrana celular é formada por uma camada dupla de lipídeos, que são organizados de forma que a cabeça polar dos ácidos graxos sejam direcionados para o exterior da célula e também para o interior da célula – para que possam interagir com o meio aquoso existente neste meio (lembre-se que nosso corpo possui cerca de 70% de água!), e para que as longas caudas apolares estejam localizadas no interior da membrana, para que estabeleçam as várias forças de Van der Waals que possibilitam que a membrana celular seja uma estrutura resistente.

Estrutura representativa de um ácido graxo (neste caso, um ácido graxo saturado). Note que ele apresenta uma parte polar ou hidrofílica (no grupo carboxila) e uma parte apolar ou hidrofóbica (cadeia carbônica longa).

 

Bicamada lipídica, demonstrada por um corte transversal de uma célula.

Quando nos ferimos – seja por um corte, ou uma batida forte, algo que agrida nosso organismo – e a membrana celular é rompida, uma enzima denominada fosfolipase (ela tem este nome porque os lipídeos de membrana são os fosfolipídeos, lipídeos que contem um íon fosfato ligado ao glicerol – além dos glicolipídeos, que contêm um açúcar ligado ao glicerol e também do colesterol que auxilia na formação da membrana interferindo na fluidez da mesma) quebra os fosfolipídeos em ligações específicas que formam o ácido araquidônico.

Estrutura do ácido araquidônico.

 

O ácido araquidônico dá origem a diferentes substâncias, como as prostaglandinas, as tromboxanos. Elas são formadas pela ação de enzimas chamadas ciclo-oxigenases, mais conhecidas pela abreviação COX.

As prostaglandinas são moléculas sinalizadoras que mandam ao cérebro a informação de que algo está “errado” naquele local. Em resposta, o cérebro nos faz sentir dor. A dor faz parte do mecanismo de defesa, pois permite que notemos que fomos feridos e tomemos mais cuidado com o local do ferimento, e que não continuemos fazendo aquilo que está machucando.  Elas também participam do processo inflamatório, que assim como a dor, faz parte do mecanismo de defesa.

Estrutura de uma prostaglandina.

 

Grande parte dos medicamentos analgésicos e antiinflamatórios se baseiam na ação de um inibidor enzimático, que bloqueia a enzima COX-2, responsável pela formação de prostaglandinas. Se a enzima que produz as prostaglandinas é inibida, ela se torna incapaz de produzir estas moléculas, e a sinalização da dor e do processo inflamatório não ocorre.

Os tromboxanos são moléculas formadas pela ação de enzimas chamadas tromboxano-sintases, a partir de precursores formados também pelas ciclo-oxigenases. São agregadoras de plaquetas, que são células sanguíneas com a função de regenerar o tecido lesionado.

Estrutura de um tromboxano.

Assim, os tromboxanos são as moléculas indiretamente responsáveis pela reconstrução do tecido que foi ferido, após termos sido avisados pelas protaglandinas, através da dor, de que havíamos nos machucado e que algo estava errado.

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Uma resposta para O que acontece no nosso organismo – quimicamente falando – quando nos ferimos?

  1. Davidson Lima disse:

    Não é a toa que aparentemente, pela nossa evolução, esse maldito dedinho será extinguido nas próximas gerações. Eles são inúteis para nosso equilíbrio e convenhamos, só causam problemas.

    Bom artigo, Cris 🙂

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